domingo, 28 de dezembro de 2008

Jangada...

Entre o mar e o asfalto ele andava pela areia, pensando na vida e olhando ao longe o horizonte esfumaçar suas idéias, enquanto uma seqüência de ondas arrebentava na areia e espantava as gaivotas da beira. “se eu tivesse um barco... ou até uma jangada. Saia por aí. Agora! Sem rumo.”- era tudo no que conseguia pensar, há algum tempo só isso lhe passava pela cabeça.
- Julião! Vem ver o pôr-do-sol aqui da pedra!
- Já vou, Ritinha. – dizia, “Já vi Ritinha...”, pensava.
O garoto de olhos antigos se assustou com um peixe que saiu voando da água e, batendo na pedra, desceu rolando de volta para o mar, no que a menina que lhe lançava um olhar meigo disse numa voz doce:
- Ah, meu lindo, vem aqui comigo, vem. Que eu te protejo desses peixes.
- Se você fosse um bicho, qual seria, Rita?
- Eu... Acho que uma leoa, que é forte. E você?
- Uma gaivota.
- Gaivota?! Que sem graça...
- Minhas paixões são voar e o mar. Viajar. A gaivota é tudo. O símbolo da liberdade devia ser uma gaivota.
O ônibus de turismo já buzinava para que os viajantes retornassem aos assentos. A partida se deu em alguns minutos. Agora rumo a uma montanha conhecida que havia na região.
No caminho, ele não conseguia se concentrar no que ela dizia. Era a mente já em ritmo de partida, de novos horizontes. O corpo não via onde podia ser o píer de começo, era um entrave que lhe mantinha a inércia do não-movimento. Mas nos seus olhos quem parasse pra observar já veria o reflexo das novas paisagens. Floridas e reflexivas, aquelas de quando a gente senta na beira de um barco ou de uma pedra e fica olhando até onde o mar começa a sumir. Aquela sensação de pequeno e de tão grande que o mundo nos provoca quando mostra os olhos. Essa coisa azul de gosto misturado, que dá brilho ao rosto, que dá vontade de cantar em silêncio, só com o pensamento. Era uma solidão própria, escolhida. Como a que a gente sempre precisa de tempos em tempos.
Na montanha já tinha um pic-nic, um monte de gente falando, aquela correria e movimentação que tira qualquer concentrado de transe. E a conversa voltou a ser sobre nada, os pensamentos de mundo foram embora e ele acabou voltando pra vida terrena, deixando a metafísica pra outras horas.
Mas uma frase tinha ficado gravada na pedra entre os arbustos, era coisa de quando ele pensava muito e deixava algum desenho ou marca sem perceber. “voltemos ao que há, pois ao que não há não podemos voltar, só flutuar entre.”. a turma que leu não entendeu. Talvez nem ele tenha entendido. Mas o lanche ficou bem mais gostoso.